quinta-feira, 29 de abril de 2010

robert musil vs ebony bones

como acontece com muitos homens que chegaram a uma
situação importante, esse sentimento consistia, longe
de qualquer egoísmo, num amor profundo pelo que é útil,
digamos, a um nível universal e supra-pessoal; por ou-
tras palavras, numa veneração sincera por aquelas coi-
sas sobre as quais construímos o que nos é vantajoso,
não pela simples razão de o construirmos mas em harmo-
nia e em concomitância com isso e por razões de ordem
geral. trata-se de uma questão de grande importância:
um cão de raça procura o seu lugar debaixo da mesa,
insensível aos pontapés, não porque é cão e se rebaixa,
mas por dedicação e fidelidade; também na vida os in-
divíduos frios e calculistas não conseguem metade do
êxito alcançado por aquelas almas mais perfeitamente
equilibradas capazes de nutrir pelas pessoas e pelas
situações que lhes são proveitosas sentimentos verda-
deiramente profundos.

- robert musil -
(o homem sem qualidades)



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- ebony bones -
(don't fart on my heart)

quarta-feira, 28 de abril de 2010

fernando gomes vs the hollies

excesso de poesia

ia todos os dias à biblioteca e todos os dias era o
primeiro a chegar. pedia um livro de poesia e sen-
tava-se de frente para a entrada, lendo e fantasi-
ando. sempre que a porta se abria, descolava dis-
farçadamente os olhos dum poema e observava
quem entrava. andou nisto anos a fio, entre versos,
rimas e sonhos, procurando a mulher da sua vida.
quando a encontrou perdeu-a em poucos minutos.
na realidade, não teve prosa para ela.

- fernando gomes -


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- the hollies -
(stay)

jorge luis borges vs jon hopkins

o sonho

se o sonho fosse (como dizem) uma
trégua, um puro repouso da mente,
porque é que, se te acordam bruscamente,
sentes que te roubaram uma fortuna?
porque é que é tão triste madrugar? a hora
despoja-nos dum dom inconcebível,
tão íntimo que só é traduzível
num torpor que a vigília doura
de sonhos, que bem podem ser reflexos
truncados dos tesouros da sombra,
e que o dia deforma nos seus espelhos.
quem serás esta noite no escuro
sonho, do outro lado do seu muro?

- jorge luis borges -
(el suenõ, trad menino mau)



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- jon hopkins -
(inside)

terça-feira, 27 de abril de 2010

osvaldo pol vs rjd2

a palavra exacta

imensurável é o silêncio
onde as pedras
desde sempre estremecem.
há um gemido de anjos
percorrendo a noite.
e no mar
crescem árvores
que florescem
somente para as sombras.

a minha voz
percorre círculos concêntricos
e explodem os milagres
quando escolho a palavra exacta.

- osvaldo pol -
(la palabra precisa, trad menino mau)



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- rjd2 -
(exotic talk)

domingo, 25 de abril de 2010

machado de assis vs santogold

(...)
ignora-se o que pensou durante os primeiros
minutos: mas, ao cabo de um quarto de hora,
eis o que ele dizia consigo: - ninfa, doce
amiga, fantasia, inquieta e fértil, tu me
salvaste de uma ruim peça com um sonho ori-
ginal, substituíste-me o tédio por um pesa-
delo; foi um bom negócio. um bom negócio e
uma grave lição: provaste-me ainda uma vez
que o melhor drama está no espectador e
não no palco.

- machado de assis -
(a chinela turca)



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- santogold -
(say aha)

sexta-feira, 23 de abril de 2010

jean genet vs 40 winks

para analisar um quadro são precisos mais
esforço e uma complexa operação. foi real-
mente o pintor - ou o escultor - quem por
nós realizou essa dita operação. assim nos
é restituída a solidão do personagem ou
objecto representados e nós, que olhamos,
para a compreendermos e sermos por ela to-
cados, devemos ter experiência não da con-
tinuidade mas sim da descontinuidade do
espaço.
cada objecto cria seu espaço infinito.

- jean genet -
(o estúdio de alberto giacometti)



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- 40 winks -
(sketch)

quarta-feira, 21 de abril de 2010

carlos cullere vs autolux

referências para uma análise da paixão

o verdugo crê que o exercício da sua tarefa o transforma em vítima.
tivemos a colecção mais completa de venenos: para libertar-nos do
outro, de nós mesmos do outro em nós, cada um baixou mil vezes
a mão armada do punhal: continuamos à espera.
o fracasso tem infinitos nomes, como deus, sem dar-nos conta
vamos descobrindo-os inutilmente a cada momento.
não dormir mas entrar finalmente na coragem.
por tanto ter clamado a estima de si, pelo luciferino gesto de
persistir nas linhas dum rosto.
num remoto país de cujo nome não me quero recordar espera-me
uma gargalhada de terra.
perdendo pouco a pouco todos os meus medos chego ao medo.
cantar o quê, quem: a noite canta através duma dupla fileira de dentes.
os amáveis atractivos da vida terminam numa folha de papel higiénico.
em memória do desenvolvimento dos monstros um segundo antes
de ser devorado
amén.

- carlos cullere -
(trad menino mau)



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- autolux -
(turnstile blues)

terça-feira, 20 de abril de 2010

bertolt brecht vs caravan palace

(...)
maë - e tu não és livre?

garga - não. pausa. nós não somos livres. tudo começa com o
café da manhã e com a porrada que se leva quando se faz
asneiras, e as lágrimas da mãe salgam a sopa dos filhos e é
o suor da mãe que lhes lava as camisas e estamos garantidos
até chegar a idade do gelo e a raiz fica no coração. e quando
se é adulto e se quer fazer qualquer coisa de alma e coração,
descobrimos que já fomos pagos, iniciados, carimbados, ven-
didos a preço alto e não temos liberdade para sucumbir.
(...)

- bertolt brecht -
(na selva das cidades)



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- caravan palace -
(sofa)

segunda-feira, 19 de abril de 2010

manuel del cabral vs xx

palavra

palavra, que mais queres tu?
que mais?

venho buscar o teu silêncio
o que à força de esperar,
se endurece... se faz estátua...
para falar.

já vês, palavra, já vês,
ferida, tu, sem idade...

que fará contigo o soldado?

que farão os grilos? que fará
na ponta da espada
a eternidade?

- manuel del cabral -
(trad. menino mau)


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- xx -
(intro)

sexta-feira, 16 de abril de 2010

pablo neruda vs santogold

viii

que coisa irrita os vulcões
que cospem fogo, frio e fúria?
porque é que cristovão colombo
não pôde descobrir a espanha?
quantas perguntas tem um gato?
as lágrimas que não se choram
esperam em pequenos lagos?
ou serão rios invisíveis
que correm para a tristeza?

- pablo neruda -
(livro das perguntas, trad. menino mau)


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- santogold -
(you'll find a way)

quarta-feira, 14 de abril de 2010

gonçalo m. tavares vs autolux

edgar allan poe

a imaginação não é uma questão de habilidade. é mais
uma questão de levantar as coisas do seu sítio e ver
o que elas escondem debaixo. como se faz a uma pedra.
se levantares uma pedra pesada do jardim verás que
debaixo dela está um pedaço de terreno de cor dife-
rente da restante relva do jardim. mais esbranquiçada,
com ar mais doente: o sol não passou por ali.
a imaginação? a imaginação é o sol também passar por
ali.
(levanta a pedra, meu caro, faz um esforço.)

- gonçalo m. tavares -


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- autolux -
(robots in the garden)

terça-feira, 13 de abril de 2010

mircea dinescu vs the ting tings

a viagem

para descer a rua com a arte
não uses o mesmo elevador escangalhado
em que se acertaram tantos negócios duvidosos...
renuncia primeiro à poesia
e terás menos dores de estômago.
podes por cinismo prolongar a tua vida
podes substituir a palavra pelo acaso
podes atirar a língua ao sol como uma edição príncipe
podes levar (polindo todos os dias alguns gramas)
a torre eiffel para a cave.
o suicídio já não resulta.
para te tornares poeta célebre na europa
é preciso ser pelo menos canibal,
ou propor uma solução louca para o florescimento do sara
(que sejam enviados para lá os que têm água
nos pulmões, por exemplo).
os doidos passivos já não têm procura:
se casares com uma máquina de picar carne
haverá uma empresa americana
a pagar-te a viagem de lua de mel
com a condição de dar à luz filhos picantes e sem sabor
como o seu célebre hamburger...
a sociedade de consumo humilha-te no inverno com as
melancias
e no verão cansas-te levando ovos dentro do sobretudo
para as solistas da metropolitan.
dormes à beira do sena
e de repente cheira-te ao dimbovista,
acordas provinciano
achas que se virares numa ruela em montparnasse
começa bucareste.
não parece fácil perceber
que a poesia já não precisa de papel
que uma bala se ouve mais do que um livro
que os dentistas os mecânicos as cabeleireiras e os
aviadores
os empregados os engenheiros os professorzinhos os
almirantes e os varredores ricos
com justa razão se recusam a ler sonetos,
porque o objectivo supremo é ser parente das nódoas de
gordura da sopa,
ou seja estar sempre ao de cima.

- mircea dinescu -


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- the ting tings -
(fruit machine)

wulffmorgenthaler vs metronomy


- metronomy -
(heartbreaker)



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- wulffmorgenthaler -

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- wulffmorgenthaler -

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- wulffmorgenthaler -

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- wulffmorgenthaler -

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- wulffmorgenthaler -

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- wulffmorgenthaler -

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- wulffmorgenthaler -

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- wulffmorgenthaler -

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- wulffmorgenthaler -

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- wulffmorgenthaler -

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- wulffmorgenthaler -

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- wulffmorgenthaler -

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- wulffmorgenthaler -

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- wulffmorgenthaler -

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- wulffmorgenthaler -

sexta-feira, 9 de abril de 2010

isaiah berlin vs the doors

terás falta de liberdade ou liberdade política apenas se fores impedido por seres humanos de atingir um objectivo. mera incapacidade de atingir um objectivo não é falta de liberdade política. esta questão é exposta pelo uso de expressões modernas tais como 'liberdade económica' e o seu oposto 'escravatura económica'. debate-se, muito plausivelmente, que se um homem é demasiado pobre para se permitir algo que não esteja legalmente banido - uma fatia de pão, uma viagem à volta do mundo, o recurso a tribunais - ele tem tão pouca liberdade de o possuir como se lhe fosse proibido por lei. se a minha pobreza fosse uma espécie de doença que me impedisse de comprar pão, ou pagar a viagem à volta do mundo ou que o meu caso fosse julgado, tal como o coxear me impede de correr, esta incapacidade não seria como é natural descrita como falta de liberdade, muito menos como falta de liberdade política. é apenas porque acredito que a minha incapacidade de conseguir algo se deve ao facto de outros seres humanos terem criado condições segundo as quais eu, ao contrário de outros, esteja impedido de ter dinheiro suficiente para pagar, me considero uma vítima de coerção ou escravatura. ou seja, a utilização deste termo depende de uma teoria económica e social particular no que diz respeito à minha pobreza e debilidade. se a minha falta de meios materiais resulta da minha falta de capacidade física ou mental, então começo por dizer que estou privado de liberdade (e não simplesmente de pobreza) apenas se eu aceitar a teoria. se, além disso, acreditar que estou a ser impedido de ter algo que desejo por um determinado conjunto de condições que eu considero injustas ou desiguais, falo de escravatura ou opressão económica.

- isaiah berlin -
(two concepts of liberty, trad. menino mau)



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-the doors -
(break on through)

quarta-feira, 7 de abril de 2010

bertolt brecht vs boredoms

o vosso tanque, general, é um carro forte
derruba uma floresta esmaga cem
homens,
mas tem um defeito
- precisa de um condutor.
o vosso bombardeiro, general
é poderoso:
voa mais depressa que a tempestade
e transporta mais carga que um elefante
mas tem um defeito
- precisa de um piloto.
o homem, meu general, é muito útil:
sabe voar, e sabe matar
mas tem um defeito
- sabe pensar.

- bertolt brecht -
(o vosso tanque, general, é um carro forte)



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- boredoms -
(ichi)

terça-feira, 6 de abril de 2010

hiroshi watanabe vs murcof


- maiz -
(murcof)



suo sarumawashi

sarumawashi, literally "monkey dancing" evolved over a
1000-year history in japan. ancient japanese chronicles
refer to it as a form of religious ritual designed to
protect the horses of warriors. it later developed into
a popular form of festival entertainment, and was
performed all over japan from temples to imperial courts.
today, sarumawashi is ranked alongside noh and kabuki as
one of the oldest and most traditional of japan's
performing arts. it features acrobatic stunts and comedic
skits performed by highly trained macaque monkeys.


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- big - (hiroshi watanabe)


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- choromatsu - (hiroshi watanabe)


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- aikichi - (hiroshi watanabe)


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- aikichi with bamboo sieve - (hiroshi watanabe)


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- big in bucket - (hiroshi watanabe)


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- choromatsu 2 - (hiroshi watanabe)


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- aikichi 2 - (hiroshi watanabe)


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- genki - (hiroshi watanabe)


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- kanpei - (hiroshi watanabe)


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- genki with monchhichi - (hiroshi watanabe)


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- kanpei counting fingers - (hiroshi watanabe)


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- kojiro - (hiroshi watanabe)


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- kojiro 2 - (hiroshi watanabe)


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- kosuke - (hiroshi watanabe)


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- kojiro & kurimatsu - (hiroshi watanabe)


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- yuji playing koto - (hiroshi watanabe)


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- fukunosuke's hands - (hiroshi watanabe)

savino vs eluvium

o nevoeiro é cómodo. transforma a cidade numa
enorme caixa de bombons, e os seus habitantes
em outros tantos frutos cristalizados... pas-
sam no nevoeiro mulheres e raparigas encapu-
chadas. um fumo leve bafeja em volta das na-
rinas e da boca entreaberta... dar por si nu-
ma sala prolongada por espelhos... abraçar-se
cheirando ainda a nevoeiro, enquanto o nevo-
eiro lá fora pressiona a janela e a cortina
diáfana, discreta, silenciosa, protectora...

- savino (via umberto eco) -


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- eluvium -
(leaves eclipse the light)